Do tempo do Onça 07/03/2014
- Antero Greco - O Estado de S.Paulo
Cartola -- graúdo ou médio, calejado ou aprendiz -- gosta de apregoar profissionalismo a torto e a direito, para se mostrar antenado com os tempos que correm no futebol pelo mundo.
Na prática, porém, muitas vezes toma atitudes que o desdizem e revelam o quanto é conservador. Uma delas está na cláusula que proíbe jogador emprestado de enfrentar o clube de origem.
Veja o caso de Jadson. O moço andava amuado e encostado no São Paulo, candidato certo a esquentar banco na temporada de 2014. Conversa vai, papo vem, surge a chance de mudar de ares e se transferir para o Corinthians, que em troca despacharia Pato para o Morumbi. O centroavante custou nota alta para os alvinegros, mas também percebeu que ficaria escanteado e fora do time. Feito.
PUBLICIDADE
O acerto pareceu ideal para todo mundo. Um pra cá, outro pra lá, vida que segue e seja o que Deus quiser?
Não foi bem assim. Os zelosos dirigentes decidiram colocar no papel que, no momento em que as duas equipes se encontrassem, independentemente da competição, os renegados não poderiam entrar em campo -- ou melhor, poderiam, desde que se pagasse multa de R$ 1 milhão. (O colega Victor Birner garante que a cláusula estipula 5 mi!)
Tem cabimento isso? Tanto faz se for um milhão ou se forem cinco, o absurdo só varia no valor, não na essência. Esse acordo de cavalheiros comporta diversas contradições, além de escancarar mentalidade antiga, do tempo do Onça, de quando se amarrava cachorro com linguiça e se jogava com chancas com travas de prego.
Já na largada, a primeira incongruência. Se determinado atleta não serve para o time, mesmo que momentaneamente, por que temer tê-lo pela frente?
Há o medo de que arrebente com o jogo e contribua para a derrota?
Ora, se isso acontecer, será sinal de que o sujeito se recuperou, botou os brios para fora e voltará à antiga casa revigorado. Se ele fosse imprescindível, não teria recebido sinal verde para a saída.
Ah, mas e a rivalidade entre os clubes, não conta?
Só em parte. Se fosse para levar a fundo as diferenças históricas, nem sequer se abriria negociação entre corintianos e são-paulinos.
Cada um recusaria a proposta e não se tocaria mais no assunto. Se resolveram topar -- indício de maturidade --, então que prosseguissem na abolição desse item que remonta há 60, 70 anos.
Não só. Onde entra a vontade dos jogadores, os maiores interessados na mudança de rotina?
Alguém lhes perguntou se tinham vontade de entrar em campo nessa situação?
E a necessidade dos técnicos, não vale nada?
Pato não pode jogar no Paulistão, por questão de regulamento. Mas Jadson entrou e, num piscar d'olhos se encaixou no esquema de Mano Menezes.
Virou titular rapidinho, ajustou o meio-campo e de lambuja tem marcado gols, como os dois no meio da semana. Agora vê interrompida a sequência por uma bobeira, uma superstição amadora.
Não acabou. O campeonato estadual afunda numa draga só, com público escasso, rendas esquálidas, em demonstração de apatia do consumidor.
A presença de Jadson serviria de chamariz, de atrativo para o Choque-Rei. O torcedor do Corinthians iria a campo no mínimo para mexer com os rivais.
O seguidor do São Paulo pelo menos iria pegar no pé do "traidor" (e não é). Clima para o espetáculo, dinheiro em caixa. Coisa de gente que pensa grande.
Mas preferem ficar em picuinhas dos tempos do Quarto Centenário. Depois, queixam-se de prejuízos.
O golaço
A quarta-feira teve amistosos entre seleções para deixar zonzo quem curte futebol. Todos os classificados para o Mundial testaram seus elencos, não faltaram dribles, lances e gols bonitos.
Mas o gol de placa ocorreu no Soccer City, depois dos 5 a 0 do Brasil sobre a África do Sul e veio na figura de um garotinho que invadiu o gramado para chegar perto dos jogadores da seleção.
A segurança queria impedir, mas Neymar o pegou nos braços e o fez mascote do grupo. Singelo e emocionante.