Encruzilhada 16/04/2014
- Antero Greco - O Estado de S.Paulo
O futebol no Brasil está no mato sem cachorro - e não me refiro à assembleia que hoje aclamará Marco Polo Del Nero, sem concorrência, como novo presidente da CBF.
Muito menos às ações na Justiça comum que ameaçam emperrar o início das Séries A e B de 2014.
A encruzilhada com que o esporte mais popular no País topa é de raiz, de transição, sem que se saiba qual rumo tomará daqui em diante.
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A dúvida atroz é a seguinte: os Estaduais definham, estão numa penúria de dar dó, morrem por inanição. Se desaparecerem, pelo menos na forma como são disputados atualmente, devem varrer do mapa muitas agremiações, pequenas porém tradicionais, além de enterrar tesouros em histórias de títulos e conquistas.
A tendência que sejam substituídos pelas competições nacionais -- o Brasileiro e a Copa do Brasil. Há intenção de fortalecer os grandes duelos, porque interessam mais às emissoras de televisão e aos patrocinadores.
Esses torneios, no entanto, não conseguem estimular no público rivalidades tão intensas quanto aquelas bairristas, paroquiais, de fundo de quintal. Ou seja, a rixa entre times do mesmo estado.
Por mais que a tabela da elite, por exemplo, aponte confrontos entre equipes de forte apelo popular, dificilmente veremos estádios cheios e comoção com os resultados, salvo exceções de praxe.
Ainda agora provocam mais polêmicas e discussões de boteco um Corinthians x Palmeiras, um Flamengo x Vasco do que clássicos como Corinthians x Fla e Vasco x Palmeiras.
No mínimo, deveriam equivaler-se, já que estão todos em busca da hegemonia. Não é o que ocorre, independentemente do sistema de disputa.
Quando havia fase de classificação e, em seguida, os confrontos de eliminação direta, lotação só nas partidas finais, aquelas decisivas.
A primeira parte era um mar de lugares vazios nas arquibancadas.
Nos pontos corridos, em que cada rodada tem significado único e coloca em jogo pontos imprescindíveis para o título, não mudou muito o panorama - o mais corriqueiro são espaços vagos à espera de gente que venha a ocupá-los.
Algo está muito errado, e não existem programas para quebrar esse círculo vicioso. Pipocam iniciativas, aqui e ali, com estudos universitários, com propostas do Bom Senso, com factoides promovidos por CBF ou federações, que deveriam ser as principais interessadas em encontrar soluções.
Entra ano, sai ano, e ocorre esvaziamento dos estádios; no momento, espera-se que, por milagre, as praças esportivas erguidas para o Mundial atraiam freguesia só por sua beleza.
Conversa fiada, porque as que estão em funcionamento só viram torcedores a espirrar pelo ladrão em ocasiões esporádicas.
Evocar as diferenças regionais como chamariz não funciona. No máximo, a estratégia se revelará positiva em casos isolados.
Por mais que se tente um tira-teima amplo, o Brasil não é como a Alemanha, a Itália, a Espanha, a Inglaterra, a França.
Esses países, juntos, não dão metade do nosso.
A dimensão territorial pesa -- e como! Em todos os sentidos: nos costumes, no antagonismo, nos deslocamentos.
Na Itália, tifosi do Napoli (no sul) levam pouco mais de duas horas de carro, ou uma hora e pouco de trem rápido, para percorrerem os 226 km que os ligam a Roma (no centro).
Simpatizantes do Grêmio (no sul)terão de fazer 1.350 km, se quiserem ver o time deles enfrentar o Cruzeiro (no centro).
Complicado, não?
O desafio maior talvez se concentre em estimular o torcedor a ir ao estádio, seja lá qual for o campeonato, só pelo prazer de ver seus ídolos em ação.
Não importa se o time esteja na rota da taça, no meio da tabela ou na boca do precipício.
A tese, levantada pelo colega Leo Bertozzi, da ESPN, faz sentido. Não adianta decretar o fim dos Estaduais e dar moral para os Nacionais, se não se reconquistar o público, se ele não entender que vale a pena sair de casa para um bom programa de lazer.
Enquanto isso não ocorrer, na maioria dos casos estádios semidesertos serão símbolo de indiferença.