A grande família petista 26/04/2014
- O Estado de S.Paulo
Nem é preciso fazer escavações profundas. Arranhe-se apenas a superfície do sistema petista de poder e, certo como a noite que se segue ao dia, se encontrará um escândalo, uma maracutaia, uma armação, uma negociata, um vexame, um ato mal explicado ou inexplicável à luz da ética pública.
E não se diga que é intriga da oposição em ano eleitoral.
Para ficar apenas na safra da semana, ora é uma auditoria da Petrobrás que afirma que em 5 de fevereiro de 2010 alguém foi autorizado verbalmente a sacar US$ 10 milhões de uma conta da Refinaria de Pasadena, na qual a empresa ainda tinha como sócia a Astra Oil.
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A revelação foi publicada pelo Globo. Quem autorizou, quem sacou, o porquê do saque e o que foi feito com a bolada, isso a Petrobrás não conta.
Diz, burocraticamente, que o procedimento seria "uma atividade usual de trading" e nele "não foram constatadas quaisquer irregularidades".
Ora, para variar, são as sucessivas apurações da Polícia Federal (PF) sobre a amplitude da rede de conveniência recíproca em que se situam as ligações do deputado André Vargas, do PT paranaense, com o doleiro Alberto Youssef.
O cambista foi preso no curso da Operação Lava Jato, que expôs um esquema de branqueamento de dinheiro, por ele comandado, da ordem de R$ 10 bilhões.
O monitoramento, com autorização judicial, das comunicações do já agora réu Youssef trouxe à tona uma história de tráfico de influência que reduz a mera nota de rodapé o pedido de Vargas ao parceiro para que lhe arranjasse um jatinho para levá-lo numa viagem de férias ao Nordeste -- descoberto, o favor custou ao favorecido o cargo de vice-presidente da Câmara, ao qual teve de renunciar.
A traficância, essa sim, era coisa graúda.
Prometendo a Vargas que, se fizesse a parte dele, os dois conquistariam a "independência financeira" -- palavras textuais do doleiro captadas pela PF --, ele acionou o deputado para que o Ministério da Saúde, então chefiado pelo também petista Alexandre Padilha, contratasse com o laboratório Labogen, de que Youssef é controlador oculto, o fornecimento de uma partida de medicamentos contra a hipertensão.
O negócio renderia R$ 31 milhões em cinco anos.
Quando a tratativa foi noticiada pela Folha de S.Paulo, Padilha imediatamente tirou o time de campo.
Deu-se o dito pelo não dito, nenhum contrato foi assinado, nenhum real desembolsado.
Mas Padilha, pré-candidato ao governo paulista, era muito mais do que, digamos, o polo passivo do arranjo.
Relatório da PF praticamente sustenta que, em novembro passado, ele ofereceu a Vargas um nome para dirigir o Labogen.
Numa mensagem de celular lida pelos federais, o deputado identifica o apadrinhado para o doleiro e lhe dá o número de seu telefone, antes de arrematar: "Foi Padilha que indicou".
Dois dias antes, Vargas tinha escrito a Youssef:
"Falei com Pad agora e ele vai marcar uma agenda comigo".
Naturalmente a PF não pode afirmar com todas as letras de que Padilha, ou Pad, se tratava.
Mas quem mais poderia ser?
Afinal, o indicado pelo interlocutor de ambos para ser o executivo da Labogen, Marcus Cezar Ferreira de Moura, o Marcão, tinha sido nomeado pelo ministro, em 2011, coordenador de promoção e eventos da Saúde.
No ano anterior, ele trabalhara na reta final da campanha de Dilma Rousseff.
Só achando que o ministro era um rematado nefelibata, o suprassumo da ingenuidade, para imaginar que ele considerasse o Labogen um laboratório sério.
A sua folha de pagamento não soma mais do que R$ 28 mil.
A polícia apurou que foi uma das firmas de fachada usadas por Youssef para remeter ilegalmente ao exterior US$ 444,7 milhões.
Vargas, a PF também averiguou, não é o único petista das relações do doleiro.
Outros citados, por ora, são os deputados Cândido Vaccarezza e Vicente Cândido, de São Paulo.
Um admite ter se encontrado com o cambista no prédio onde ele e Vargas moram.
O outro diz que o conheceu -- em Cuba, ora vejam -- em 2008 ou 2009.
Em suma, formam todos uma grande família com parentes de sangue e por afinidade que às vezes brigam, mas em geral se ajudam a conseguir poder, prestígio e riqueza.
Há mais de dez anos o solar da família fica em Brasília.