A derrota da Seleção Brasileira e a do PT 09/07/2014
- Blog de Reinaldo Azevedo - Veja.com
Nunca achei, e os leitores sabem disto, que a vitória ou a derrota da Seleção Brasileira teria uma tradução imediata nas urnas.
Tratei do assunto na minha coluna na Folha na sexta-feira passada, intitulada “A derrota da Seleção e a de Dilma”. “A derrota da Seleção e a de Dilma”.
Escrevi então:
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“A vigarice intelectual tenta transformar o tal ‘pessimismo com a Copa’ numa espécie de metáfora -- ou metonímia -- do suposto ‘pessimismo com o Brasil’.
Também as críticas ao governo e o legítimo esforço para apeá-lo do poder segundo as regras do jogo seriam obra de pessoas de maus bofes, que saem por aí a espalhar o rancor e a amargura -- coisa, enfim, de quem deveria deixar ‘estepaiz’, já que se mostra incapaz de amá-lo…
Com todo o respeito, a tese de que o Brasil precisa perder a Copa para Dilma perder a eleição é só uma trapaça intelectual de quem quer que Dilma vença a eleição, ainda que o Brasil perca a Copa.”
O desastre a que assistimos no campo, nesta terça, ele sim, é simbólico de certo estado de coisas no Brasil.
Reparem que foram muito poucas as críticas contundentes ao desempenho pífio da Seleção Brasileira nos cinco jogos anteriores.
Aqui e ali se apontou o descompasso entre a realidade e os fatos, mas nada com a dureza e com a clareza que a ruindade do time estava a pedir.
Por quê?
Porque também o jornalismo -- com raras exceções -- vivia e vive sob uma espécie de tutela, com receio de ser acusado de falta de patriotismo.
O governo federal decidiu, infelizmente, fazer politicagem com a Copa do Mundo.
A máquina publicitária oficial não teve pudor nem mesmo de pegar carona na contusão de Neymar, tentando transformá-lo numa espécie de herói nacional.
Dilma Rousseff resolveu bater um papinho com Dilma Bolada no Facebook, de sorte que não dava para saber se a Bolada era a Rousseff ou a Rousseff, a Bolada.
A presidente encontrou tempo para atacar os “urubus do pessimismo”.
Referia-se, em princípio, àqueles que previam que o torneio seria um desastre organizacional, o que, é sabido, não foi.
Mas não só a eles: os tais “pessimistas” estariam interessados na derrota do Brasil só para o PT perder as eleições…
Há, ainda, uma fatia dos políticos brasileiros que está convicta de que pode manipular a vontade popular a seu gosto.
Sim, muitas críticas infundadas foram feitas à realização da Copa no Brasil, mas é evidente que parte delas procedia e procede -- como procedentes são milhares de restrições outras que se fazem ao governo de turno, o que é normal numa democracia.
A máquina publicitária oficial, no entanto, incapaz de fazer a exploração rasteira do torneio -- como esquecer as vaias do Itaquerão? --, decidiu “monitorar” às avessas o debate:
Tolhendo as críticas, intimidando os críticos, tentando silenciar as vozes discordantes, colando a pecha de sabotadores naqueles que dissentem.
Não custa lembrar que o PT, com o apoio de setores comprados da imprensa -- comprados pela publicidade oficial --, criou até uma lista negra de jornalistas, sobre a qual muita gente que chegou a me parecer séria um dia fez um silêncio cúmplice, preferindo olhar para o outro lado.
Críticos do governo foram tachados de “jornalistas da oposição” e de “adversários da realização da Copa no Brasil”.
Pois é…
Nos últimos dias, especialmente depois que veio a público uma pesquisa Datafolha em que Dilma havia oscilado quatro pontos para cima, na margem de erro, o Planalto se assanhou de novo em pegar carona na Copa.
Dilma anunciou na sua conversa no Facebook que vai ao Maracanã, no domingo, entregar a taça ao vencedor -- ocasião, então, em que “Maracanaço” talvez passe a ter outro sentido.
Qual é a última torcida que cabe à presidente?
Por razões que o técnico argentino chamou nesta terça de “culturais” -- ele se referia ao fato de que a imprensa de seu país comemorava o desastre brasileiro --, resta à nossa governanta torcer desde já para que seja a Holanda ou a Alemanha a vitoriosa.
Ou lhe caberá a honra, depois de ter esconjurado os urubus, de entregar o troféu ao capitão da Seleção da Argentina.
Eu não acho que a derrota da Seleção fará o eleitor votar dessa ou daquela maneira.
Não o subestimo assim.
Isso não nega o fato de que o PT tinha planos para tentar fazer da eventual vitória uma arma para esmagar os adversários.
Seria ineficaz porque, reitero, não é assim que se dão as coisas.
Mas o Brasil ficaria um pouquinho mais incivilizado, matéria em que essa gente é craque.