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O OUTRO LADO DA NOTÍCIA

De surpresa em surpresa
10/07/2014 - Celso Ming - O Estado de S.Paulo

O governo se reconhece surpreendido pela disparada da inflação para acima do teto da meta, para 6,52% em junho. Foi o que disse terça-feira o ministro interino da Fazenda, Paulo Caffarelli.

E, no entanto, se não era propriamente uma caçapa cantada, esse estouro era bem mais do que uma simples possibilidade. Estava no radar de todos os analistas.

Teria bastado que a inflação de junho fosse de 0,38% -- foi 0,40%. E um governo surpreendido por essa goleada da inflação não deixa de ser chocante.


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É mais uma indicação de que o governo está perdido em campo, sem resposta e sem postura diante dos primeiros gols do adversário.

Seguir afirmando que a inflação pode ficar por aí ao longo de mais dois ou três meses, mas que fechará o ano abaixo dos 6,5% ao ano, não é nem uma aposta; é ficar mais perto da leviandade.

O Banco Central, por exemplo, está projetando para todo o ano de 2014 uma inflação de 6,4%.

É um número sujeito a quaisquer imponderáveis, como tantos que vêm acontecendo.

O risco do estouro da meta em 2014 é cada vez mais alto.

Entre as indicações de que o governo está sem reação e sem estratégia é o que ocorre no câmbio, que agora desempenha a função de âncora cambial, ou seja, trabalha para evitar a alta do dólar que, por sua vez, encareceria os importados.

Durante os últimos três anos, os atuais integrantes da equipe econômica criticaram insistentemente as operações de carry trade.

Ou seja, criticaram as práticas especulativas feitas com moeda estrangeira.

Trata-se do levantamento de empréstimos em moeda estrangeira a juros baixos no exterior para trocá-los por reais no câmbio interno, aplicá-los no mercado financeiro brasileiro a juros que hoje estão nos 11% ao ano e, assim, ganhar um bom retorno, na moleza.

O problema dessas operações do ponto de vista do interesse brasileiro é que a qualquer momento os dólares podem levantar voo e produzir uma forte escassez de moeda estrangeira no câmbio interno.

Para que isso não aconteça, o Banco Central tem de garantir uma certa estabilidade nas cotações da moeda estrangeira, o que o obrigou a prorrogar até dezembro os leilões de dólares no câmbio futuro, que já somam US$ 90 bilhões.

Pois hoje, as operações carry trade são desejadas. Foram estimuladas pelo governo que, em junho, reduziu a zero o IOF que antes era de 6% para operações de curto prazo.

Lá se foi o tempo em que o ministro Guido Mantega denunciava a valorização forçada do real (baixa do dólar) como efeito perverso da guerra cambial promovida pelos grandes bancos centrais.

O prolongamento da guerra cambial também passou a ser desejado, para que os dólares continuem aportando no Brasil e continuem a segurar a inflação por aqui.

No entanto, ontem, a Ata do Federal Reserve (o banco central dos Estados Unidos) acenou com o fim das compras de títulos em outubro e, portanto, com o fim das emissões de dólares, o que pode provocar certa escassez de dólares e menos fluxo para o Brasil.

A atual prostração da economia, que se caracteriza por uma inflação em 12 meses mais perto dos 7% do que dos 6% e pelo crescimento do PIB já mais próximo de zero do que de 1%, não foi produzida por nenhum sapo enterrado.

Tem explicações racionais. É, em grande parte, consequência das opções experimentalistas de política econômica feitas nos últimos três anos.


  

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