Mais do mesmo 18/07/2014
- Antero Greco - O Estado de S.Paulo
Muita gente ficou surpresa -- até indignada -- com o anúncio de Gilmar Rinaldi para o cargo de coordenador de seleções.
O tom dos comentários na mídia e em redes sociais, logo após a entrevista de José Maria Marin, no final da manhã de ontem, oscilou entre a indignação e a desconfiança.
Esperava-se nome de impacto para função tão delicada, e não o de ex-goleiro e, pelo menos até a quarta-feira, representante de jogadores.
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Pois, sem ser esnobe, não me abalou nem chocou a opção da CBF.
A escolha de Marin e de Del Nero, o sucessor que só toma posse em 2015 mas anda pra cima e pra baixo com o presidente, é coerente e tem lógica.
Reconfirma o perfil administrativo e filosófico (ops!) da cúpula do futebol brasileiro.
E a falta de tato, de feeling -- pra ficar em expressão mais fina -- da dupla.
A alternativa encontrada para iniciar o processo de reconstrução canarinha foi, no mínimo, desajeitada.
O momento requeria alguém com forte aceitação popular e com alguma experiência na área.
Especulou-se, ou imaginou-se, a contratação de personagem do calibre de Falcão, Zico, Júnior, Raí, Leonardo, Zinho.
Qualquer um deles atuaria, neste momento, como apaziguador da opinião pública.
Seria crédito e escudo para os cartolas desgastados.
Não é o caso de Gilmar. Antes de mais nada, e que fique bem claro, não se trata de julgamento pessoal, de preconceito, prevenção, cisma e quetais.
A lembrança que guardo dele, dos tempos de atleta e mesmo do início da carreira de agente, é positiva. Polidez nunca lhe faltou. Ainda bem.
Tampouco coloco em primeiro plano a função que tinha até o meio da semana e da qual, garante, se desligou para evitar choque de interesses.
Digamos que, por princípio, se dá crédito à veracidade da informação oficial.
Mas Gilmar sabe que terá dificuldade para desvincular a imagem de empresário do trabalho de coordenador técnico. Terá de conviver com a sombra, sobretudo ao soltar listas de convocações.
O entrave está no fato de que Gilmar há tempo não atua diretamente com o futebol -- seja como cartola, comentarista ou técnico.
Não está nas frentes de batalha, com olhar crítico.
O negócio dele era ajustar carreiras, discutir contratos, definir agendas dos clientes, tratar com os patrões, com patrocinadores.
Eventualmente dar explicações para a imprensa sobre o futuro deste ou daquele profissional.
De uma hora para outra, salta de lado do balcão para descascar abacaxi espinhoso.
Para azedar o fruto, a conversa, na coletiva no Rio, não esparramou entusiasmo. O lugar-comum pautou o encontro.
Marin choveu no molhado, pra variar.
Como não se desvencilha dos cacoetes de político, falou, respondeu, tergiversou e não disse nada. Del Nero, ao lado, referendou tudo.
Gilmar também apelou para frases feitas e deu ênfase ao coletivo.
Ao contrário de Gallo, responsável pelas categorias de base, que ressaltou a busca pelo talento individual.
Já há aí um ponto a ser afinado em conjunto.
O novo dirigente da CBF fechou portas para treinador de fora, e assim nega a possibilidade de se tentar algo diferente, ousado, com o que carrega de perspectivas e riscos.
Da mesma forma, mandou recado para quem assumir o time principal: deverá ter como referência o que faz Gallo.
Alto lá: sintonia é desejável, mas o professor da equipe nacional hierarquicamente está acima.
Sei não...
Está com cara de mais do mesmo.
Haverá um técnico -- Tite, Muricy ou um terceiro menos cogitado --, que chegará com a tarefa de montar time para Copa América e Eliminatórias.
Manterá boa parte do que fez Felipão, com novidades, para marcar território, e pedirá união geral.
O Brasil se classificará para o Mundial da Rússia -- com folga ou no sufoco, pouco importa, mas estará lá. E tudo continuará como sempre.
Como escrevi na crônica de anteontem, não se espere guinada em campo, se fora dele a mentalidade permanecer enferrujada.
E, com a turma que está no poder, pode tirar o cavalo da chuva, que ele se resfria.