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O Outro Lado Porque tudo tem dois, menos a esfera.

O OUTRO LADO DA NOTÍCIA

As contas públicas afundam
01/08/2014 - O Estado de S.Paulo

Só com uma criatividade escandalosa, ou com uma sorte quase inimaginável, o governo conseguirá apresentar no fim de 2014 um resultado fiscal parecido com o anunciado no começo do ano -- um superávit primário de R$ 99 bilhões.

O secretário do Tesouro, Arno Augustin, continua prometendo alcançar a meta. Já havia prometido no mês anterior, ao apresentar os números de maio, e mantém sua exibição de otimismo.

O superávit primário é o dinheiro separado para o serviço da dívida -- pelo menos para uma parte dos juros, como tem ocorrido no Brasil.


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Depois de um péssimo primeiro semestre, o governo terá apenas seis meses, em condições muito desfavoráveis, para produzir pouco mais de 70% do prometido.

O resultado primário acumulado de janeiro a junho chegou a modestíssimos R$ 29,38 bilhões. Esse valor ficou 43,67% abaixo do alcançado um ano antes e corresponde a apenas 29,68% do programado para o ano inteiro.

Esse foi o saldo primário das contas gerais do setor público. Entram no balanço as contas federais, estaduais e municipais e os dados da maior parte das estatais controladas pelo Tesouro (resultados da Petrobrás e da Eletrobrás ficam de fora).

O governo central, formado por governo federal, Banco Central (BC) e Previdência Social, participou com R$ 15,37 bilhões acumulados até junho. Este valor corresponde a 19,02% do saldo programado para o poder central, de R$ 80,8 bilhões.

As contas consolidadas do setor público são calculadas pelo BC e o resultado primário corresponde à necessidade de financiamento.

O Tesouro também divulga mensalmente um balanço do governo central, mas seus cálculos, um pouco diferentes daqueles produzidos pelo BC, são baseados no confronto entre receitas e despesas primárias.

A pequena diferença é insuficiente para mudar o panorama. As contas do governo central estão em condições precárias há alguns anos, continuaram em mau estado no começo de 2014 e pioraram em maio e junho. No dois meses houve déficit primário.

O resultado de junho, pelos cálculo do BC, foi um buraco de R$ 2,7 bilhões. Pelo critério do Tesouro, o buraco ficou em R$ 1,95 bilhão.

Nenhum dos dois resultados vale uma comemoração. Ambos apontam problemas sérios na economia e na gestão do dinheiro recolhido pelo poder central. O saldo apontado no relatório do Tesouro foi o pior para o mês desde o ano 2000.

Por esse relatório, o governo central acumulou entre janeiro e junho um superávit primário de R$ 17,24 bilhões -- 50,11% menor que o dos primeiros seis meses de 2013.

Por esse critério, o governo terá de produzir um resultado primário de R$ 63,56 bilhões no segundo semestre -- mais que o triplo do conseguido até junho -- para alcançar os R$ 80,8 bilhões prometidos para todo o ano.

Esse valor será alcançado, segundo o secretário do Tesouro.

Para justificar seu otimismo, ele menciona a expectativa de crescimento econômico maior no segundo semestre, com maior arrecadação de impostos e contribuições, e o ingresso de receitas especiais, como os pagamentos, a partir de agosto, do novo Refis.

O refinanciamento de dívidas tributárias, segundo a estimativa inicial, deveria render R$ 12,5 bilhões neste ano. A projeção foi elevada para R$ 15 bilhões e, em seguida, para R$ 18 bilhões.

Mas os técnicos da Fazenda apostam ainda na entrada de outros recursos. Alguns já começaram a entrar na primeira metade do ano.

A receita de dividendos pagos por estatais, de R$ 10,49 bilhões no semestre, foi 36,3% maior que a de janeiro a junho de 2013.

Esse valor representou 60,85% do superávit primário acumulado no período. Se a conta incluir a arrecadação de bônus de concessões, de R$ 1,24 bilhão, as receitas extraordinárias, isto é, fora do padrão recorrente, corresponderão a 68,08% do resultado primário contabilizado até junho.

É preciso levar em conta o peso desse tipo de receita para avaliar a condição das contas públicas. Contas sólidas e sustentáveis são aquelas dependentes da arrecadação rotineira de tributos e da gestão prudente dos gastos.

As contas brasileiras estão muito longe desse padrão.


  

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