Continuo o assunto da última coluna, sobre os inúmeros lugares-comuns que existem em nosso futebol e que deveriam ser, no mínimo, relativizados.
Um deles é que volante com bom passe deveria jogar mais adiantado, como um meia. Outro é que os meias, armadores, deveriam atuar mais próximos ao gol. Estes conceitos são consequência da divisão que houve, tempos atrás, no meio-campo, entre os volantes que marcam e jogam do meio para trás e os meias que atacam e jogam do meio para frente. Com isso, desapareceram os grandes meio-campistas, que atuam de uma área à outra.
Essa é uma das principais razões da queda de qualidade de nosso futebol, da diminuição da posse de bola, da troca de passes e do jogo coletivo, do predomínio dos lançamentos longos, dos lances isolados, espasmódicos, do excesso de jogadores que conduzem demais a bola e da ausência de foras de série no meio-campo, no nível dos melhores do mundo.
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Ainda bem que temos Neymar. Em vez de trocar passes, jogam a bola para ele. Neymar, por se destacar mais pela individualidade, por não depender tanto do jogo coletivo, como outros craques, por saber que, na seleção, é ele quem tem de decidir, e por ser capaz de driblar vários jogadores e fazer o gol, já levantou e vai levantar o prestígio de muitos treinadores e dirigentes. O problema é que ele é um só e nem sempre estará presente, como contra a Alemanha.
Existem cada vez mais jogadores que atuam bem em várias posições. Os técnicos adoram esse tipo de atleta, mesmo que ele seja medíocre. Pior que o medíocre é o medíocre versátil. Mais importante ainda que ser versátil é o que, durante a partida, percebe o momento de fazer algo diferente e surge em outro lugar do campo para fazer uma jogada decisiva. Isso não significa que ele possa atuar desde o início em outras posições.
Quando Muricy pede que Ganso faça mais gols não significa que ele deva ser escalado para atuar mais adiantado. Ganso evoluiu quando passou a iniciar as jogadas no próprio campo, além de participar da marcação. De vez em quando, aparece na frente e faz um gol e, somente assim, é muito elogiado. Os grandes meio-campistas do futebol mundial são brilhantes pela armação das jogadas e não porque, esporadicamente, fazem gols.
No futuro, goleiros e zagueiros das grandes equipes terão também de ter habilidade e bom passe. O mundo adorou na Copa ver Neuer sair para fazer com perfeição a cobertura dos defensores. Mas, com a bola nos pés, para passar e driblar, quando necessário, ele está muito longe de Rogério Ceni, disparado, o melhor goleiro com os pés de toda a história do futebol, além de ser excelente debaixo das traves. Rogério já fez 123 gols, sendo 63 de pênalti e 60 de falta. Um fenômeno.
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*Tostão, médico e ex-jogador, é um dos heróis da conquista da Copa do Mundo de 1970.