Impeachment Já! 02/11/2014
- Blog de Reinaldo Azevedo - Veja.com
Ontem à tarde, houve dois protestos em São Paulo. Um deles reuniu, segundo a PM, pelo menos 2.500 pessoas na Avenida Paulista -- e não mil, como está no UOL.
A outra, uns 200, no Largo da Batata.
Ambas foram convocadas pelo Facebook.
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O primeiro cobra uma auditoria na eleição presidencial de 2014 e pede o impeachment de Dilma; a segunda, pela enésima vez, culpa o governador Geraldo Alckmin pela crise hídrica em São Paulo.
Não funcionou no primeiro turno, não funcionou no segundo turno, tenta-se agora o terceiro turno. Não está funcionando de novo… Mas sigamos.
A esmagadora maioria das pessoas que se manifestavam na Avenida Paulista cobrava a auditoria e defendia o impeachment de Dilma na suposição de que ela conhecida a roubalheira na Petrobras, conforme afirmou à Polícia Federal e ao Ministério Público o doleiro Alberto Youssef.
Nem é necessário demonstrar -- mas, se for preciso, demonstro com facilidade -- que a imprensa paulistana trata com simpatia todos os protestos das esquerdas, as marchas em favor da maconha e até os black blocs.
Alguns de seus defensores são alçados à condição de intelectuais.
Já um protesto que não é organizado por “progressistas”, bem, aí cumpre ridicularizar as pessoas, transformá-las numa caricatura, enxovalhá-las, reduzi-las à condição de golpistas.
Vamos lá: a esmagadora maioria dos cartazes da Paulista trata de uma suposta fraude na eleição, pede a auditoria na eleição e defende o impeachment (dada aquela suposição, claro!, que tem de ser comprovada).
Um senhor, no entanto -- e ainda que houvesse 10, 20 ou 100 --, pede uma intervenção militar.
A prova de que é “avis rara” no protesto é que foi, ora vejam!, entrevistado pela Folha e pelo Estadão, que, milagrosamente, publicam quase a mesma matéria, com diferenças que estão apenas no detalhe.
Seu nome é Sérgio Salgi, tem 46 anos e é investigador de polícia.
E por que ele foi achado pelos repórteres dos dois jornais?
Porque carregava um cartaz “SOS Forças Armadas”.
Bastou esse cartaz para que a Folha Online desse o seguinte título: “Ato em SP pede impeachment de Dilma e intervenção militar”.
Se algum maluco estivesse na passeata cobrando ajuda aos marcianos, o título poderia ser: “Ato em SP pede impeachment de Dilma e intervenção dos ETs”.
Não é a primeira vez que isso acontece.
Em 2007, embora fossem outras as circunstâncias, surgiu o “Movimento Cívico pelo Direito dos Brasileiros”, que ficou conhecido como “Cansei”.
Seus promotores foram impiedosamente ridicularizados pela imprensa e por personalidades púbicas a serviço do PT.
Foram tachados de representantes da “elite branca”.
A notícia do mensalão tinha menos de dois anos, o escândalo dos aloprados, menos de um, mas uma simples manifestação de protesto foi tratada como coisa de golpistas.
O Globo Online também noticia o protesto em São Paulo.
O repórter não entrevistou o policial Sérgio Salgi, mas encontrou outra maneira de enxovalhar os que protestavam.
Transcrevo: “O protesto reúne muitas senhoras de guarda-chuva, em razão do sol forte. Algumas levaram seus cachorrinhos de estimação para o protesto”.
Manifestações das esquerdas, como vocês sabem, contam com uma palavra que a imprensa adora: “ativistas” -- não sei o que é isso; deve-se ser o oposto complementar dos “passivistas”…
Já um ato que é inequivocamente caracterizado como “de direita”, bem, esse conta com “senhoras de guarda-chuva”…
Sabem como são as dondocas: não querem se pelar ao sol.
Entre as 2.500 pessoas, contavam-se nos dedos os tais guarda-chuvas.
Ah, claro! Elas também levavam seus cachorrinhos, entendem?
É evidente que o destaque dado a esses lateralidades busca desmoralizar o protesto.
O cantor e compositor Lobão se manifestou em favor da recontagem dos votos e disse o óbvio: não se tratava de um movimento em favor da volta do regime militar.
Boçalidades
Não que boçalidades reais, de fato, não tenham sido ditas.
Foram.
A ser verdade o que relatam Estadão, Folha e Globo, o deputado federal eleito Eduardo Bolsonaro (PSC-RJ), filho de Jair Bolsonaro (PP-RJ), afirmou o seguinte:
“Ele [seu pai] teria fuzilado Dilma Rousseff se fosse candidato esse ano. Ele tem vontade de ser candidato mesmo que tenha de mudar de partido”.
E emendou: “Dizia na minha campanha: voto no Marcola, mas não em Dilma. Pelo menos ele tem palavra”.
A ser isso mesmo, trata-se de uma notável coleção de bobagens.
Evidentemente, o “fuzilado” de sua fala é uma metáfora.
Mas quem se importa?
Quando fala em votar até “em Marcola”, procura deixar claro o quanto repudia Dilma, não seu apreço pelo bandido.
Mas quem se importa?
Quem não quer que seu discurso seja confundido não fala essas tolices.
O ânimo para transformar os manifestantes em golpistas já é evidente.
Quando se oferece o pretexto, tudo fica mais fácil.
No Brasil, é permitido marchar em favor da maconha. A venda e o consumo de maconha são ilegais. Manifestantes são tratados como bibelôs.
No Brasil, é permitido marchar em favor do aborto. O aborto, com as exceções conhecidas, é ilegal. Manifestantes são tratados como pensadores.
No Brasil, é permitido marchar em favor de corruptos condenados pelo Supremo. Manifestantes são tratados como ideólogos.
No Brasil, é permitido marchar em favor da recontagem dos votos e, sim, em favor do impeachment. O Artigo 5º da Constituição garante tudo isso. Não obstante, manifestantes são tratados como pessoas ridículas e golpistas.
Nota final, que traduz um sequestro moral: os esquerdistas, sempre adulados pelos jornalistas, querem controle social da mídia e mecanismos de censura, ainda que oblíquos.
Mas que isto também fique claro: os que estão decididos a dizer “não” terão de enfrentar, inclusive, as brigadas da desqualificação da imprensa, que sempre ficam muito satisfeitas quando alguém como Eduardo Bolsonaro fala aquelas besteiras.