Cardozo precisa sair! 17/02/2015
- Blog de Rodrigo Constantino - Veja.com
Sei que todos estão em clima carnavalesco, mais atentos ao “fogo” da Mocidade do que aos rumos de nossa política. Faz parte essa fuga.
O que me preocupa não é a alienação voluntária desses cinco dias, mas a dos demais 360 dias do ano.
E sabe quem mais adora o carnaval para jogar para baixo do tapete a política? Os políticos no poder!
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Vejam o caso do ministro da Justiça, por exemplo. José Eduardo Cardozo recebeu em audiência os advogados da empreiteira Odebrecht, citada nas investigações da Operação Lava-Jato (ainda lembra dela?).
Trata-se de um caso claro e espantoso de perigosa mistura entre estado e governo. O ministro está ali para defender os interesses nacionais, não partidários.
A confusão entre estado, governo e partido é grande no Brasil, e o PT é o mestre dela.
O ex-presidente do STF, Joaquim Barbosa, encontrou tempo para comentar o caso, deixando de lado a folia e se mostrando mais preocupado com o país a longo prazo.
Em seu Twitter, Barbosa pediu a demissão de Cardozo.
“Nós, brasileiros honestos, temos o direito e o dever de exigir que a Presidente Dilma demita imediatamente o Ministro da Justiça. Reflita: você defende alguém num processo judicial. Ao invés de usar argumentos/métodos jurídicos perante o juiz, você vai recorrer à Política?”, questionou Barbosa.
A revista Veja desta semana mostrou as conversas impróprias de Cardozo, que se reuniu também com Sérgio Renault, sócio de um escritório que defende a UTC Engenharia.
Cardozo disse que o encontro com Renault foi apenas na antessala de seu gabinete, sem uma reunião de fato.
O ministro negou também ter tranquilizado as empreiteiras envolvidas no esquema de corrupção da Petrobras.
A UTC limitou-se a dizer que Renault não é advogado da empresa, apesar do sócio dele, Sebastião Tojal, defender a construtora.
Diz a reportagem:
Procurados por VEJA, Cardozo, Renault e Sigmaringa tropeçaram nas próprias contradições ao tentar esclarecer a reunião no Ministério da Justiça, classificada por eles como um mero bate-papo entre amigos sobre assuntos banais.
Cardozo disse inicialmente que não se reuniu com Renault. Depois, admitiu o encontro.
A primeira reação de Sigmaringa também foi negar a audiência com Renault no gabinete do ministro, para, em seguida, recuar.
Os amigos compartilham, como se vê, do mesmo problema de memória.
Na versão de Cardozo, a reunião teria sido obra do acaso. Sigmaringa, um “amigo de longa data”, teria ido visitá-lo.
Renault, que estava em Brasília e tinha um almoço marcado com o ex-deputado, decidiu se encontrar com Sigmaringa também no ministério.
Pimba!
Por uma conjunção cósmica, o advogado da UTC, empresa investigada pela Polícia Federal, acabou no gabinete de José Eduardo Cardozo.
Não é preciso ter lido o Nobel de Economia Douglass North (mas ajuda) para saber do peso das instituições no progresso de um país.
Países desenvolvidos são aqueles que conseguiram criar instituições sólidas e republicanas, ou seja, blindadas contra a invasão politiqueira.
Paulo Guedes tem dedicado várias de suas colunas no GLOBO para tocar nesse ponto, defendendo a migração do Antigo Regime para a Nova República brasileira.
Chegou a questionar se estávamos observando atos isolados de alguns heróis, como o próprio Barbosa e Sergio Moro, ou se era uma mudança institucional importante em curso.
Na coluna de ontem, tende a uma resposta mais otimista, citando inclusive a maior independência do Congresso sob o comando de Eduardo Cunha, desafeto da presidente Dilma.
E procura demonstrar alguma esperança em nosso futuro:
Apostar no aperfeiçoamento das instituições é o único caminho seguro para a prosperidade.
Para reequilibrar a economia e regenerar a política, teremos de apostar nas instituições.
A “independência” do Banco Central, inaugurada no Plano Real e institucionalizada no sistema de metas de inflação, trouxe aos brasileiros uma moeda decente.
Do mesmo modo, a independência do Poder Judiciário exibida nas admiráveis atuações de Joaquim Barbosa e Sergio Moro aumentou as chances de que nossos filhos e netos possam viver num país melhor.
Ao contrário, a degeneração das instituições é uma conhecida rota para o caos.
Os socialistas bolivarianos e peronistas do século XXI, que nos últimos anos apostaram cada vez mais no controle do Legislativo e do Judiciário, atacando o Estado de Direito e a liberdade de imprensa e aprofundando suas intervenções nos mercados, levaram finalmente seus países à ruína econômica e à violência política.
Essa aposta no aperfeiçoamento institucional também se aplica aos primeiros movimentos da Câmara de Deputados sob a presidência de Eduardo Cunha.
No momento em que se revela à Justiça um mercado político “paralelo”, onde se compra governabilidade “por fora” dos fóruns republicanos e dos orçamentos públicos, a declaração de independência do Legislativo por Cunha e sua proposta de levar adiante uma reforma política são bastante desejáveis.
Seriam portanto precipitadas as críticas de que o PMDB estaria apenas renegociando novos termos de adesão à “velha política”, aumentando o preço de fisiológica sustentação parlamentar ou vendendo caro um seguro presidencial contra o Impeachment.
Penso que está tudo em aberto, que seguimos em uma transição incompleta do Antigo Regime para uma Nova República, que os inimigos da sociedade aberta foram flagrados e estão em fuga à luz das informações em livre fluxo e que estaremos já em 2015 regenerando nossas práticas políticas e aperfeiçoando nossas instituições.
Amém! É o que todos os brasileiros decentes esperam.
Mas para que possa haver alguma esperança de fato, será preciso que o povo faça sua parte.
E isso inclui abandonar um pouco a euforia carnavalesca para se dedicar aos rumos de nossa política, inclusive fazendo coro ao ex-ministro do STF e pedindo a demissão do ministro José Eduardo Cardozo.
Uma Nova República não comporta esse tipo de atitude daquele que deveria zelar pela Justiça imparcial e isonômica do país.