Despetização será longa 15/03/2015
- Blog de Reinaldo Azevedo - Veja.com
Neste domingo, parcela expressiva da população brasileira foi ou está nas ruas em paz, em ordem, mas com muita convicção, reivindicar o combate à corrupção, o fim da roubalheira, o respeito às instituições.
Têm razão todos aqueles que dizem que a questão é muito maior do que Dilma Rousseff.
Ocorre que Dilma Rousseff é termo de uma equação que hoje é igual a recessão, juros pornográficos (e ainda vão crescer) e inflação alta.
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Poderíamos estar nessa pindaíba em razão de erros cometidos por uma elite dirigente atrapalhada, mas de boa-fé… Sim, não é algo que devamos reivindicar… O negócio é rimar sempre decência com competência.
Mas insisto: não fosse um escândalo de proporções inéditas no mundo, o petrolão, é certo que a indignação seria menor.
Hoje, a esmagadora maioria dos brasileiros sabe quem quebrou a Petrobras e por quê.
A mulher eleita há quatro meses e meio -- há apenas dois e meio de posse do segundo mandato -- não é a mesma que governa.
Ou melhor: é! Não existe é o país vendido pela candidata.
Inflação e recessão empobrecem as pessoas. No país da contabilidade política fantasiosa, em que bastam alguns minguados reais para um indivíduo se tornar “classe média”, é preciso refazer as contas.
Pressão inflacionária e dólar a R$ 3,26 devolvem milhões para a pobreza num estalar de dedos. Dilma foi vaiada por operários no Anhembi, não pelos empresários.
Como sabe que vêm dias e anos difíceis pela frente, poderia ter feito um mea-culpa, mas se deixou engravidar pelo ouvido por assessores equivocados, que lustram a sua teimosia: foi à TV no dia 8 falar de uma país que não existe.
Armou o gatilho contra si mesma. O panelaço surpreendeu até quem bateu panelas.
Corrupção também empobrece o povo, como é sabido. E o petrolão, com seu desastroso efeito na Petrobras, com desdobramentos já dramáticos no (des)emprego, superou os largos limites de uma sociedade mais ou menos acostumada à bandalheira.
Os ladrões perderam a modéstia. Os “donos do poder” perderam o senso de proporção.
Dilma é hoje uma presidente sitiada em seu palácio, cercada de áulicos incapazes de dizer o que ela tem de ouvir.
Os donos do povo
Quando teve início o bochicho de uma grande manifestação, o Palácio deu de ombros, como sempre, certo de que o povo tem um dono: o PT.
Líderes de ditos movimentos sociais, como este inefável João Pedro Stédile, saíram a falar como se o Brasil fosse um feudo dominado por senhores da guerra.
Afinal, Lula o instigou a botar o seu “exército na rua”.
Em vez de buscar baixar a temperatura da crise, ministros resolveram pôr lenha na fogueira, classificando de “golpe” a simples manifestação de descontentamento.
Não há nada de ilegal, de ilegítimo, de antidemocrático ou de golpista em reivindicar o impeachment de Dilma.
Se e quando acontecer, será por caminhos institucionalmente definidos.
Nas últimas horas, a própria presidente teve de mudar o discurso.
“Manifestação sim, violência não”, diz ela.
Ora, claro que não! A violência, hoje, só interessaria ao statu quo.
Logo, se houver baderneiros na rua, terão de ser contidos pelas pessoas de bem e imediatamente entregues à polícia, que estará presente para proteger manifestantes pacíficos.
A guerra
Mas não pensem que eles se conformam. Os ratos dos blogs sujos, financiados por dinheiro estatal, estão assanhados.
A ordem é atacar aqueles que são identificados como “inimigos” do governo.
Chegaram ao cúmulo de requentar, cinco anos depois, como se fosse coisa nova, uma vagabundagem que tentaram armar contra mim em 2010, sobre a qual escrevi neste blog. T
ítulo do post: “NÃO TENTEM ME INTIMIDAR. NÃO FUNCIONOU ANTES; NÃO VAI FUNCIONAR AGORA! OU: OS TERRORISTAS ESCONDEM; EU MOSTRO!”.
Como sempre, a orientação que vem de cima é tentar intimidar a imprensa independente.
No ano passado, a tática foi outra: o PT resolveu criar uma lista de jornalistas e comunicadores que, segundo os companheiros, fazem mal ao Brasil.
É claro que estou lá. Deram-se mal comigo: conseguiram, na prática, fechar a minha revista em 2006.
Como desdobramento daquele fato, ajudaram a multiplicar a minha voz. Hoje, chego a muito mais gente porque trabalho 18 horas por dia.
Os financiados pelo poder têm tempo de se dedicar à mentira, à safadeza e à desqualificação.
Afinal, este é um país em que membros de um Partido dos Trabalhadores fazem passeata numa sexta à tarde, e trabalhadores sem partido, no domingo…
Entenderam a ironia da coisa?
Trabalho longo
Não pensem que o trabalho de despetização do Brasil será fácil. Está apenas no começo.
Para que o país entre no eixo do desenvolvimento, da produtividade, da justiça social sustentável, da eficiência, da educação de qualidade, da saúde menos miserável… Isso tudo, meus caros, custará um trabalho de décadas, de gerações.
Esse resultado desastroso da economia não foi fabricado em um dia. Não é fruto dos quatro anos passados de Dilma. Ou dos oito anteriores de Lula.
É o conjunto da obra companheira que nos trouxe até aqui, com o agravante de que a corrupção assumiu proporções realmente inéditas.
Se a investigação se estender a todos os setores de infraestrutura, onde operam as mesmas empresas, com homens públicos do outro lado do balcão com igual moralidade, então ficará evidente que o Brasil institucional já não está no governo faz tempo.
Somos comandados por uma máquina que tem seus próprios critérios, suas próprias necessidades, seus próprios valores.
E não são os da democracia.
E não há nada de teoria conspiratória aqui.
O caso da Petrobras é um exemplo escancarado do que digo.
Era no país que pensava a quadrilha que lá operava?
E a quem ela prestava satisfação?
Os que, no subjornalismo de esgoto, estão a serviço desse poder recorrem a todos os expedientes para tentar transformar criminosos em virtuosos e virtuosos em criminosos.
FAZ SENTIDO. ELES SE CONSTROEM NA INVERSÃO MORAL.
Uma lista de pessoas que supostamente mantiveram ou mantêm contas no exterior -- e que inclui comandantes de empresa de comunicação e jornalistas -- é logo usada como a evidência de que existiria mesmo uma grande conspiração na “mídia” contra o PT.
Ora, o que tem uma coisa a ver com outra?
Digamos que fossem operações criminosas, o que não está evidenciado, e que todos confessassem as suas falhas.
O GOVERNO DO PT SERIA MELHOR POR ISSO?
A ROUBALHEIRA NA PETROBRAS NÃO TERIA OCORRIDO?
OS SUPERFATURAMENTOS DOS QUAIS GOVERNISTAS SE APROVEITAVAM DESAPARECERIAM?
Aliás, o temor dessa escória é o PT perder um dia a eleição, e o capilé oficial ir para o ralo.
Se bem que alguns “patriotas” ali não se acanhariam de eventualmente mudar de lado.
Muitos não estão nessa por ideologia, mas por vocação para servir, desde que bem remunerados.
E há outra coisa encantadora nesses bucéfalos.
Eles se lambuzam acusando os adversários de “falsos moralistas”.
Na base dessa acusação há um mecanismo curioso: não é que sejam contra a suposta falsidade do “moralista”.
Essa, eles até compreenderiam.
Eles rejeitam é a moral mesmo.
Não adianta! É inútil!
Se não conseguiram me intimidar quando eu só tinha um blog, que mal dava os primeiros passos, agora tampouco.
Aliás, se Dilma se livrasse dessa gente abjeta, em vez de alimentá-la, estaria certamente em situação um pouco mais confortável.
Presidente, seus homens de comunicação ainda não perceberam que esses paus mandados só servem para ampliar o campo dos seus adversários?
Chegou o dia
Talvez chova um pouco. Ninguém é de açúcar.
Levem para as ruas o Artigo 5º da Constituição, seu direito de reivindicar, de protestar, de peticionar ao estado.
Levem para as ruas a alegria, os votos de um país melhor, o desejo de mudança.
Levem para as ruas a crença na competência, no trabalho, no esforço, na honestidade.
Levem para as ruas a satisfação de saber que a democracia é a única garantia que temos contra larápios e tiranos.
As oposições estão apoiando o ato?
Que bom!
Mas são apenas isto: apoiadoras.
E é bom que assim seja.
Não estamos num confronto entre partidos, entre corporações, entre senhores da guerra.
Isso é o que o PT queria. Isso é o que o PT quer. Mas não terá.
Na sexta, 13, o que se diz “Partido dos Trabalhadores” tingiu algumas poucas ruas de vermelho.
Neste domingo, 15, que elas sejam tingidas pelos trabalhadores sem partido, de verde e amarelo.
O que se quer é decência.
Não é pedir muito.
É pedir o mínimo.
Quem sabe ainda ocupemos, um dia, as ruas para cobrar de governantes decentes a competência.