A vaca sempre tossindo 22/03/2015
- Carlos Brickmann - Observatório da Imprensa
Na campanha presidencial de 1960, Jânio Quadros repetiu o mesmo discurso, palavra por palavra, no país inteiro.
E prometeu instalar umas quinze fábricas de automóveis, cada uma localizada exatamente no local em que fazia o discurso.
Não havia problema: as comunicações eram precárias, ninguém sabia num lugar o que ele havia prometido em outro. O discurso repetido sempre parecia novo.
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Jânio se elegeu há 55 anos. A tecnologia já é outra, não dá mais para disfarçar.
E o Pacote Anticorrupção de hoje da presidente Dilma pode ser achado no Google.
Em julho de 2005, quando o Mensalão quase afundou o Governo, o presidente Lula, ao lado da chefe da Casa Civil, Dilma Rousseff, lançou um Pacote Anticorrupção igualzinho ao de agora (veja no Google: “Lula”, “Pacote Anticorrupção”, “2005″).
Em 2011, no início do seu mandato, Dilma teve de se livrar de sete ministros habituados a botar o dedo no pudim.
Em setembro, houve protestos de rua contra a ladroeira.
E a presidente anunciou de novo o mesmo Pacote Anticorrupção de 2005 -- que, diga-se, é exatamente o de hoje.
Se repetir a lei resolvesse, a corrupção no país seria abolida pela terceira vez em dez anos.
Mas será que o Governo quer mesmo pagar o preço político da luta contra a corrupção?
A Casa Civil da Presidência da República há um ano e meio está sentada em cima da Lei Anticorrupção, e não há quem a convença a regulamentá-la para que entre imediatamente em vigor.
Dilma poderia dar ordens à Casa Civil para que faça seu trabalho.
Como se explica que, tão mandona, Dilma se cale?
De Falcão...
O presidente nacional do PT, Rui Falcão, propõe o corte da publicidade oficial nos veículos que, a seu ver, apoiaram a manifestação contra Dilma.
Quer uma nova política de anúncios para a “grande mídia”.
Acusou até a Rede Record, do bispo Edir Macedo -- que apoia Dilma e indicou Marcelo Crivella para o Ministério -- de ajudar a convocar a manifestação.
Acha que o povo foi para a rua, como se fosse manada, porque a imprensa o chamou.
Um provérbio judaico sintetiza: “Gente inteligente, mesmo quando se cala, diz mais que o tolo quando fala”.
…a pombo
Este colunista acha que Falcão não tem de alisar ninguém: deve radicalizar sua posição e propor de uma vez o fim da publicidade oficial.
Não tem sentido torrar dinheiro público para dizer que o Governo é bom. Se for bom, o eleitor percebe sozinho.
Publicidade oficial, só do tipo institucional: vacinações, editais de concorrência, balanços.
E que a verba seja distribuída de acordo com os critérios clássicos de GRP -- medida de público alcançado.
Talvez isso atinja alguns veículos favoritos de Falcão, mas não dá para fazer omelete sem etc., etc., etc.
Trovão silencioso
Panelaço? Nada! Buzinaço? Sussurro. Ruidoso mesmo, trovejante, é o obumbrar do silêncio de Lula, enquanto sua afilhada Dilma é massacrada até pelos aliados mal acertados do PMDB.
Lula nada disse para apoiar a manifestação das centrais sindicais no dia 13, calou-se na manifestação do dia 15, silenciou quando o PMDB demitiu um ministro de Dilma.
Considerando-se que Lula não pula em piscina vazia, que será que ele sabe que nós não sabemos?
El vuelo del dinero
O programa Mais Médicos é uma resposta positiva às manifestações de 2013, com o objetivo de atender à população carente sem acesso à saúde.
Só que não. Hoje, já se sabe que essa história é lenda.
O ótimo repórter Fábio Pannunzio, da Rede Bandeirantes, desencavou uma gravação não autorizada da reunião em que se combinou a trama clandestina entre cubanos, Governo brasileiro e Organização Pan-Americana de Saúde, Opas.
A coordenadora da Opas, Maria Alice Barbosa Fortunato, diz:
“Se a gente coloca ‘governo cubano’, se o nosso documento é público, qualquer pessoa vai entender que a gente está driblando a coisa de fazer acordo bilateral e pode dar uma detonada.”
Para fingir que não era acordo bilateral e ocultar o objetivo real de trazer cubanos e transferir dinheiro brasileiro para Cuba, sugere a inclusão de uns poucos médicos de outros países.
“A gente pode colocar (…) Mercosul e Unasul, para tirar o foco de Cuba (…)”
Batom lá mesmo
Estaria o Governo brasileiro a par de tudo ou a iniciativa seria de funcionários ativistas?
O Governo sabia de tudo. O assessor para Assuntos Internacionais do Ministério da Saúde, Alberto Kleinman, diz que salários e forma de pagamento tinham sido definidos por Marco Aurélio Garcia, assessor internacional da Presidência.
Seriam 60% para o Governo cubano e 40% para os médicos.
O contrato que definiu o envio de dinheiro brasileiro a Cuba -- mais da metade do salário de cada médico -- foi redigido no fim de 2012.
E ficou guardado até o meio de 2013, quando o programa surgiu como se atendesse às manifestações.
Curtinho e cortante
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