Acabou-se a festa do Carf 29/03/2015
- Élio Gaspari - Folha de S.Paulo
Junto com a blitz da Polícia Federal em cima da quadrilha que operava no Conselho Administrativo de Recursos Fiscais, o Carf, vem uma boa notícia: ao contrário do que sucedeu na Lava Jato, na qual a Petrobras e as empreiteiras relutavam em colaborar com a investigação, desta vez há centenas de auditores da Receita querendo contar o que sabem, o que provam e o que denunciam há anos.
Através dos tempos e com outros nomes, o Carf é uma espécie de instância especial para grandes vítimas da Receita.
Um lambari apanhado na malha fina acha melhor pagar do que discutir. Uma grande empresa recorre e acaba no Carf.
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Lá, seu recurso é julgado por turmas presididas por servidores da Fazenda e compostas por três outros servidores, mais três representantes do sindicalismo patronal.
Nenhum outro país digno de menção tem um sistema semelhante.
No Carf tramitam 105 mil processos com R$ 520 bilhões em autuações contestadas.
A porca torce o rabo quando auditores viram consultores e ligam-se a escritórios de advocacia que militam junto ao Conselho.
A PF já achou 70 processos com desfechos suspeitos. Nove extinguiram cobranças que iam a R$ 6 bilhões.
Se procurarem direito acharão cinco cobranças que valiam R$ 10 bilhões e viraram pó.
Na casa de um conselheiro acharam R$ 800 mil em dinheiro vivo. (Há alguns anos, na casa de um auditor da Receita, acharam uma máquina de contar dinheiro.)
O Carf tem uma caixa preta.
É impossível obter dele algumas estatísticas simples: quantos recursos são apreciados? Quantos são acolhidos e quantos são rejeitados? Quantos são os recursos aceitos nas faixas de até R$ 10 milhões, R$ 100 milhões e acima de R$ 1 bilhão?
Diversas tentativas, até mesmo em pedidos de informações de parlamentares, bateram num muro de silêncio.
Quais foram os cinco maiores recursos negados? E os concedidos?
Tudo isso pode ser feito sem revelar o nome dos contribuintes.
O Ministério da Fazenda informou que "se forem constatados vícios nas decisões" do Conselho "elas serão revistas nos termos da lei".
Seria possível o contrário?
Os contubérnios vêm de longe.
Durante o mandarinato do doutor Guido Mantega eles foram combatidos e gente séria estima que se a taxa de malandragens era de 70%, hoje estaria em 30%.
Ainda assim, a operação da PF poderá transformar a Lava Jato num trocado.
O prejuízo da Viúva pode chegar a algo como R$ 19 bilhões.
Enquanto as petrorroubalheiras envolviam obras, essas são exemplos de pura corrupção, com o dinheiro indo do sonegador para o larápio, e mais nada.
Uma autuação de R$ 100 milhões era quitada por fora ao preço de R$ 10 milhões.
Nesse tipo de malfeito não há partidos políticos, nem doações de campanha, legais ou ilegais.
Só há bolsos.
Empresas de consultoria e escritórios de advocacia que julgavam ter descoberto o caminho das pedras precisam procurar bons defensores.