A Petrobras blindou a roubalheira da SBM 19/04/2015
- Elio Gaspari*
A doutora Dilma disse que a Petrobras "já limpou o que tinha que limpar".
Falso.
Falta limpar o acobertamento das suas tenebrosas transações com a companhia holandesa SBM, a maior operadora de sondas flutuantes do mundo.
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Com sede em Mônaco, é a maior empregadora do principado, perde só para o cassino.
Faturou 4,2 bilhões de euros em 2012 e 60% de seus negócios davam-se com a Petrobras.
Desde 2012 a diretoria da empresa sabia que distribuíra US$ 139 milhões no Brasil, onde seu representante era Julio Faerman, um ex-funcionário da Petrobras que teve US$ 21 milhões numa conta do HSBC suíço e hoje vive em Londres.
Homem discreto, só se conhece dele uma fotografia, com uma máscara veneziana cobrindo-lhe os olhos.
O contrato de venda da plataforma P-57 (US$ 1,2 bilhão), por exemplo, gerou uma comissão de US$ 36 milhões.
A essa altura, comissões pagas por Faerman ao "amigo Paulinho" e a Pedro Barusco já estão na papelada de Curitiba.
Falta limpar a maneira como a Petrobras e a Controladoria-Geral da União lidaram com o caso.
A Lava Jato começou em 2014, mas a faxina interna da SBM começou em 2012.
Existe uma gravação de um encontro de seus diretores no aeroporto de Amsterdam lidando com o caso.
Nela, a Petrobras é mencionada.
O grampo partiu de Jonathan Taylor, um advogado da SBM que está em litígio com a empresa, que o acusa de chantagem.
Em outubro de 2013 apareceu na Wikipedia um texto (provalmente de Taylor) denunciando a rede internacional de propinas da SBM e dando nome a bois da Petrobras.
Dias depois, sumiu, até que o assunto reapareceu em fevereiro de 2014 na revista holandesa Quote.
A Petrobras abriu uma auditoria para examinar seus negócios com a SBM e mandou funcionários à Holanda, sem dizer o que fariam.
Num comunicado oficial, informou que eles não encontraram anormalidades.
A SBM, por sua vez dizia que pagara US$ 139 milhões em comissões por serviços legítimos e a petroleira fingiu que acreditou.
Segundo Taylor, estava em movimento uma operação para abafar as propinas brasileiras.
Ele parece ter razão, pois em novembro Graça Foster revelou que soubera das propinas em maio.
E não contou ao mercado.
A conexão brasileira foi varrida para depois do segundo turno.
Dezessete dias depois da reeleição da doutora a SBM fez um acordo na Holanda e pagou uma multa de US$ 240 milhões.
Em seguida a Controladoria-Geral da União abriu um processo contra a SBM e Graça Foster fez sua revelação tardia.
Taylor contou ao repórter Leandro Colon que em agosto mandou à CGU um lote de documentos.
No dia 3 de outubro ele se encontrou na Inglaterra com três funcionários da Controladoria.
Essa reunião foi gravada, com consentimento mútuo.
A conexão SBM-Petrobras ficou blindada de maio, quando a campanha eleitoral mal começava, até novembro, quando a doutora estava reeleita.
A CGU diz hoje que abriu o processo em novembro porque só então encontrou "indícios mínimos de autoria e materialidade".
A ver.
Isso poderá ser esclarecido se forem mostrados os documentos recebidos pela CGU em agosto e o que foi dito no encontro de outubro.
Há uma velha lenda segundo a qual o Brasil seria outro se os holandeses tivessem colonizado o Nordeste.
Darcy Ribeiro matou essa charada respondendo: "Seria um Suriname".
Talvez seja um exagero, mas em novembro do ano passado, quando a SBM e o governo holandês se entenderam, Robson Andrade, presidente da Confederação Nacional da Indústria, resumiu o que acontecera em Amsterdam e o que estava acontecendo no Brasil, onde as empresas apanhadas na Lava Jato negociavam acordos de leniência:
"Eu acho que o Brasil está amadurecido o suficiente para que não coloque essas empresas com esse selo (de inidôneas). Nós vemos, por exemplo, que aconteceu a mesma coisa com a empresa da Holanda, a SBM Offshore. Será que a Holanda vai colocar essa empresa como inidônea e não vai poder participar de mais nada no mundo?"
O governo holandês e a SBM se entenderam e a Lava Jato está cuidando das propinas pagas a funcionários da Petrobras, que ficou com toda a conta.
Falta limpar o silêncio da Petrobras a partir de maio e entender a rotina da CGU de agosto a novembro, depois da reeleição da doutora.
Serviço: Quem quiser, pode pegar na rede uma magnífica narrativa do caso na revista holandesa Vrij Nederland, intitulada "The Cover-Up at Dutch Multinational SBM", dos repórteres Ham Ede Botje, James Exelby e Eduard Padberg.
Num sinal dos tempos, o trabalho da trinca foi amparado por uma fundação de estímulo à investigação jornalística.
LAVA JATO
Há fortes chances de a 2ª Turma do upremo Tribunal Federal conceder habeas corpus a um empreiteiro encarcerado pelo juiz Sérgio Moro.
Votarão os ministros Teori Zavascki, Celso de Mello, Cármen Lúcia, Gilmar Mendes e Dias Toffoli.
Como há gente presa desde novembro, fortaleceu-se o argumento dos advogados de defesa de que a prisão preventiva estendeu-se ao limite da exorbitância.
Esse tipo de decisão poderá mudar o fluxo da carceragem de Curitiba, com mais gente saindo do que entrando.
FACHIN E ROBERTS
O advogado Luiz Fachin, indicado para o STF, está comendo pão que Asmodeu amassou porque defendeu a reeleição da doutora Dilma num ato público.
Como ele não é servidor do Estado, tinha todo direito de fazer isso.
Botou a cara na vitrine, mas botou a cara dele.
A isenção política e eleitoral pode ser cobrada a magistrados e servidores, não a cidadãos.
Para ficar em exemplos ilustres, Paulo Brossard veio do MDB, Hermes Lima e Evandro Lins foram fundadores do Partido Socialista.
Eles botavam a cara na vitrine.
Há casos de advogados que costuram por dentro.
Nos Estados Unidos, em 2005, o presidente George Bush indicou John Roberts para a Corte Suprema e ele foi aprovado pelos senadores por 78 votos contra 22.
Logo depois, Bush nomeou-o presidente da Corte, cargo vitalício no qual está até hoje.
Cinco anos antes, como advogado, Roberts voara para a Flórida e aconselhara Bush a levar para a Corte Suprema sua disputa pela contagem dos votos da Flórida na eleição disputada contra Al Gore.
Ótima ideia, pois deu o mandato a Bush.
Vaccari e o PT sabiam que ele iria preso
João Vaccari Neto sabia há mais de seis meses que seria preso.
Desde janeiro a cúpula do PT sabia que sua situação era desesperadora.
Um dia o comissariado aprenderá a lidar com a proteção que dá aos seus quadros acusados de corrupção.
Até lá, arrastará as correntes do assassinato de Celso Daniel, do mensalão e do que se vê por aí.
Pelas condições de hoje, mesmo que comece a fazer isso amanhã, ainda assim será tarde.