A não ser para os mais ávidos por informação, mereceria pouco destaque o relativo mal-estar registrado em Brasília na última quinta-feira (16). Percebe-se, entretanto, mesmo num pequeno desencontro, de que modo a disfunção geral da política brasileira ganha patamares novos de hipocrisia.
O cenário foi o Palácio do Planalto. A ocasião, a posse do novo ministro do Turismo, Henrique Eduardo Alves (PMDB). Os principais personagens, ambos ausentes, atendem por Renan Calheiros (PMDB-AL), presidente do Senado, e Eduardo Cunha (PMDB-RJ), presidente da Câmara dos Deputados.
Pertencendo ao mesmo partido do novo ministro, Renan e Cunha não compareceram à cerimônia; situação desconfortável, mas sem maior relevância.
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Examinem-se os motivos do "forfait" peemedebista, porém, e o caso começa a ficar mais interessante.
Cunha, autor de projeto restringindo a 20 o número de pastas -- hoje 38 se apinham em torno da Presidência --, teria achado melhor não felicitar o indicado para um cargo que, presume-se, seria eliminado na sua arquitetura administrativa.
O caso de Renan não terá passado por tais sobrevoos de simbologia política. O presidente do Senado faz notar seu inconformismo com a saída de seu afilhado, Vinicius Lages, do ministério que Alves agora veio ocupar.
O Planalto procurou oferecer uma compensação a Renan. Sim, mas como aceitar troca sem bônus, sem suplemento de prestígio?
Interveio no universo de Renan o argumento de Cunha, de bom tom nestes tempos de austeridade. Devendo haver redução de postos na máquina, Lages será recolhido ao gabinete do presidente do Senado. Fecha-se a cara, suspende-se a barganha; o momento exige recusas.
Mas nem tanto. Desde dezembro passado, uma lista com várias sugestões de nomes tinha sido elaborada por Renan Calheiros, e o Executivo tardava em atendê-lo.
Mais um peemedebista entra em cena: o vice-presidente da República, Michel Temer, agora encarregado da "coordenação política" -- eufemismo para a distribuição ordenada de cargos e vantagens, antes de tudo dentro do próprio PMDB.
Outro nome nessa órbita partidária então se invoca -- para a Agência Nacional de Transportes Terrestres, confirma-se Jorge Bastos. Outros membros do grupo de Renan já se aprestam para lugares abertos ou por definir.
Entre pressões e prêmios, barganhas e petições de princípio, tudo se explica. Ausentar-se de uma cerimônia de posse não significa muito, pois há tantas por vir -- ainda que, por respeito às aparências, o apadrinhamento fique melhor se conduzido com máxima discrição.