Fator previdenciário, redução ou subsídio? 15/05/2015
- Solange Paiva Vieira*
Em novembro de 1999 foi aprovada no Congresso a nova regra de cálculo dos benefícios da Previdência. A regra, conhecida como fator previdenciário, partiu da premissa de que um dos principais problemas da Previdência do país residia na ausência de correlação entre contribuições e benefícios.
As aposentadorias eram, então, concedidas sem guardar uma relação com as contribuições que cada trabalhador efetuou ao longo de sua vida de trabalho.
Antes da adoção do fator, foram analisadas diversas soluções implantadas em outros países, entre as quais a passagem para um regime de capitalização, onde o trabalhador recebe uma renda vitalícia calculada a partir da poupança acumulada pelas suas contribuições.
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A passagem para o regime de capitalização no Brasil, no entanto, foi considerada inviável à época, devido às restrições fiscais e ao enorme custo de transição referente ao financiamento das aposentadorias em manutenção.
Estimativas realizadas por especialistas do Banco Mundial, do Ipea e da FGV, entre 1995 e 1997, apresentavam custo de transição oscilando entre 188% e 250% do PIB.
Com a impossibilidade de se adotar o regime de capitalização e a derrota da idade mínima no Congresso em 1998, buscava-se algo que tivesse em seu cerne a ideia de capitalização e, ao mesmo tempo, que permitisse ao trabalhador a escolha de sua idade de aposentadoria.
A regra aprovada ampliou o cálculo da aposentadoria para 80% das maiores remunerações de toda a vida laboral do trabalhador e introduziu o fator previdenciário. Era a implantação do sistema de "capitalização virtual".
O fator previdenciário considera em sua fórmula a idade, o tempo de contribuição, a alíquota e a expectativa de sobrevida do segurado no momento da aposentadoria. Com o fator, cada trabalhador recebe uma aposentadoria baseada nas suas contribuições para a Previdência e na sua expectativa de sobrevida.
Dado um mesmo salário de contribuição, o trabalhador que contribuir por mais tempo e se aposentar mais tarde receberá um valor maior do que aquele que contribuir por menos tempo e se aposentar mais cedo. Ou seja, quem acumulou uma poupança maior receberá uma aposentadoria maior.
A aposentadoria deve refletir o valor que o trabalhador poupou ao longo dos anos, e não ser um "bônus" concedido pelo Estado. Vale lembrar que no nosso sistema previdenciário existem outros benefícios que recebem subsídios, como a aposentadoria por idade, por invalidez, auxílio-doença e pensão, sob os quais o fator não incide.
Garantir o custeio de gerações atuais e futuras não é uma tarefa trivial. Quando a mudança de regra na Previdência em 1999 foi aprovada pelo Congresso, o histórico era de um deficit de R$ 307 milhões em 1996, passando para R$ 3,7 bilhões em 1997, R$ 7,7 bilhões em 1998 e R$ 9,7 bilhões em 1999.
Os brasileiros estão vivendo cada vez mais, o que é ótimo, mas precisamos pensar nos recursos necessários para garantir uma aposentadoria sustentável e previsível a todos.
Várias críticas foram feitas ao fator previdenciário, sempre baseadas no fato de que "subsídios" estavam sendo eliminados da aposentadoria por tempo de contribuição e, dessa forma, seu valor se reduzia.
Ou seja, ao reproduzir uma relação "justa" entre contribuição e benefício, os trabalhadores que optam por sair mais cedo do sistema têm o valor da sua aposentadoria "reduzido" em comparação àqueles que ficam por mais tempo. A perda desse subsídio deve ser amplamente discutida pelo Congresso Nacional.
A sociedade deve escolher se está disposta a pagar mais impostos e/ou cortar programas sociais para que um grupo reduzido de trabalhadores, que se aposenta por tempo de contribuição (19% do número de benefícios pagos pela Previdência em novembro de 2014), volte a receber o subsídio do governo. Ou melhor, para que volte a ter suas aposentadorias custeadas por aqueles que pagam seus impostos.
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*SOLANGE PAIVA VIEIRA, 46, economista, é a criadora do fator previdenciário. Foi secretária de Previdência Complementar do Ministério da Previdência (governo FHC) e presidente da Anac - Agência Nacional de Aviação Civil (2007-2010)