Ela termina o mandato? 05/07/2015
- Elio Gaspari - Folha de S.Paulo
Desde que Ricardo Pessoa começou a colaborar com as autoridades, essa pergunta tornou-se um complemento rotineiro aos comentários para quaisquer fatos.
Milton Pascowitch fechou seu acordo de colaboração e José Dirceu pediu um habeas corpus preventivo.
Será que ela termina o mandato?
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Jorge Luiz Zelada, ex-diretor da Petrobras, está preso.
Será que ela termina o mandato?
O deputado Eduardo Cunha sugere que seu aliado Michel Temer abandone a coordenação política do governo porque, enquanto ele costura alianças de dia, o PT descostura-as à noite.
Se o PMDB se afastar ainda mais do Planalto, será que ela termina o mandato?
O regime democrático brasileiro elegeu quatro presidentes: Fernando Collor, FHC, Lula e Dilma.
Um foi para casa antes de concluir o mandato. Se isso acontecer a outro, chega-se a uma taxa de mortalidade de 50%. (A do vírus Ebola esteve em 70%.)
Indo aos mecanismos práticos existentes, Dilma Rousseff pode ser impedida pelo Congresso.
Nesse caso, assume Michel Temer para concluir o mandato.
Trocar Dilma por Temer vem a ser o quê?
Dilma também pode ter o seu mandato anulado pelo Tribunal Superior Eleitoral e há processos que, algum dia, podem acabar dando nisso.
Nesse caso, a vice de Temer vai junto e assume Aécio Neves.
No país do futebol, entregar a taça a quem perdeu a final é uma coisa meio girafa.
Noutra hipótese, o TCU pode rejeitar as contas da doutora, enviar sua decisão ao Congresso e vê-la referendada, o que provoca um impedimento com padrinho.
É uma fórmula engenhosa, mas o Tribunal de Contas não chega a ser um tribunal e sua relação com as contas dos poderosos jamais encantou a plateia.
Nenhum desses três mecanismos fica de pé sem o ronco da rua.
Não se pode dizer se ele virá, nem como virá.
Quando se tratava de mandar Collor para casa, empossar Itamar Franco pareceu uma boa ideia.
E foi.
Presidente com um dígito de aprovação antes de completar um ano é coisa nunca vista.
Quem levou a doutora Dilma à situação em que está não foi a oposição, muito menos os moinhos de vento que o PT vê a cada esquina.
Foi ela mesma.
Como sairá dessa, só ela poderá saber.
As razões pela qual entrou nessa enrascada foram muitas.
Talvez a maior delas, por desnecessária e megalomaníaca, tenha ocorrido dias depois de sua vitória no ano passado, quando o PT tentou atropelar o PMDB.
MAL DO BEM
Há males que vêm para o bem.
As últimas maluquices aprovadas pela Câmara podem se transformar num fator de fortalecimento do Planalto junto aos mercados internacionais.
Quanto mais clara for a percepção de que podem aprovar o que quiserem, mais a doutora Dilma canetará as doideiras com vetos, melhor para a batalha do ministro Joaquim Levy, tentando evitar um rebaixamento do crédito do país.
PAPÉIS AMERICANOS
Durante a visita da doutora Dilma a Washington, o governo americano anunciou que pesquisou 2,5 milhões de páginas de documentos relacionados com o Brasil, produzidos entre 1964 e 1985.
Desse garimpo, extraíram 4.500 páginas que podem ser úteis para jogar luz sobre a história da ditadura e das suas transações com Washington.
O material foi entregue ao governo brasileiro e, digitalizado, ficará acessível na base do Arquivo Nacional Americano.
Tomara que não se repita o vexame da entrega de 43 papéis velhos e inúteis pelo vice-presidente Joe Biden no ano passado.
Alguns deles estavam na internet há anos.
LULA EM CAMPO
Nosso Guia tornou-se o principal articulador de uma reaproximação com o PMDB.
Em 2003, ele implodiu uma costura de José Dirceu nessa direção e cevou os pequenos partidos.
Deu no mensalão.
Aos poucos, Lula percebe que seu trabalho será em vão se não costurar o PT.
CARDOZO
Repentinamente, o pedaço do comissariado que vinha atirando no ministro da Justiça, José Eduardo Cardozo, deu-se de conta de que há uma hora em que é preferível sair do que ficar.
NABUCO E EUFRÁSIA
Até o fim do ano sairá um livro que tem tudo para cativar.
É "Um Mapa Todo Seu", o décimo romance da escritora Ana Maria Machado.
Conta a história de amor de dois grandes personagens.
Ele é Joaquim Nabuco, o charmeur dos salões como "Quincas, o Belo" e das ruas como um campeão do abolicionismo na segunda metade do século 19.
Nabuco tinha tudo, menos dinheiro.
Ela é Eufrásia Teixeira Leite, rica herdeira de uma fortuna do café.
Quando morreram-lhe os pais, foi morar num palacete em Paris, onde multiplicou sua riqueza.
Os dois foram e vieram durante 14 anos, quase casaram.
Ela morreu solteira.
Ele casou-se e detonou a fortuna da mulher investindo em papéis de um banco inglês que quebrou na Argentina.
Há um enigma nesse romance.
Por que não se casaram?
Ela não queria sair de Paris?
O abolicionismo dele ofendia a origem da fortuna dela?
Incompatibilidade patrimonial?
Ana Maria Machado construiu sua hipótese, mas para se chegar a ela será preciso esperar o livro.
Uma coisa é certa: vai-se aprender mais sobre essa fantástica senhora que soube viver e acumular riqueza investindo o que tinha.
Só não conseguiu dar-lhe um destino, pois deixou quase tudo para os pobres de Vassouras, e o pecúlio esfarelou-se em Lava Jatos desta vida.
ENGANO
A doutora Dilma disse que não demite ministro pela imprensa.
Enganou-se.
Demitiu Guido Mantega do Ministério da Fazenda pelos jornais e fez mais, mantendo-o no cargo, insepulto, por vários meses.
O FASCÍNIO PETISTA PELO CAMINHO DO BREJO
Em oito meses aconteceram tantas coisas em torno do governo da doutora que algumas delas parecem esquecidas.
Às vésperas do segundo turno da eleição de 2014, Dilma Rousseff, horas antes de uma reunião com o companheiro João Pedro Stedile e outros chefes de movimentos sociais, anunciou que "a reforma política é a condição para o efetivo combate à corrupção".
O comissariado propunha uma reforma plebiscitária com um receituário que poderia incluir o famoso voto de lista.
Nesses dias os companheiros já sabiam que o Congresso não comprava sua reforma.
Mais: sabia que Eduardo Cunha era candidato a presidente da Câmara.
Inebriados pela vitória, resolveram atropelar.
Enfrentariam Cunha e tocariam a agenda do rolo compressor.
(Já tinham escolhido um banqueiro para sequestrar o programa econômico de Aécio Neves mas, como podiam tudo, isso era um detalhe.)
A reforma plebiscitária e o lançamento do petista Arlindo Chinaglia para disputar com Eduardo Cunha indicavam que o PMDB seria atropelado.
Foram ao embate, tomaram uma sova, pulverizaram a liderança parlamentar do governo e acabaram entregando a coordenação ao príncipe do PMDB, Michel Temer.