Desforra de Pessimildo 26/08/2015
- Folha de S.Paulo
A presidente Dilma Rousseff (PT), quem diria, reconheceu que errou diante da crise econômica.
Segundo declarou em entrevista a esta Folha e aos jornais "O Globo" e "O Estado de S. Paulo", demorou para perceber que a situação poderia ser mais grave do que imaginava.
"Talvez nós tivéssemos de ter começado a fazer uma inflexão antes", completou. Se não o fez, foi porque "não tinha indício de uma coisa dessa envergadura".
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Mesmo os mais crédulos petistas terão dificuldades para acreditar na versão presidencial -- mas, num paradoxo fácil de entender, preferirão se deixar enganar por esse enredo fantasioso.
Do contrário, precisarão admitir que Dilma não enxergou o óbvio.
Durante todo seu primeiro mandato, não faltaram alertas sobre o esgotamento do modelo econômico que patrocinou. Em 2014, a arrecadação já caía de forma acelerada; era claro que fortes ajustes seriam inevitáveis.
Na disputa eleitoral, a campanha da petista até criou um personagem ranzinza para zombar de quem criticava o governo.
Tratava-se do boneco Pessimildo, que talvez hoje a presidente queira contratar como conselheiro.
A despeito do muito que parece haver de insincero no mea-culpa de Dilma, a verdade é que, para um país imerso em profunda crise, interessa menos o que se diz do passado e mais o que se faz em relação ao futuro.
Quanto a isso, a presidente deu sinais que merecem ser acompanhados com atenção.
Indicou, por exemplo, que apoia certas reformas essenciais, como a da Previdência.
É sem dúvida positivo que Dilma tenha se alinhado ao diagnóstico de que o país tem um problema com o envelhecimento da população e que é necessário reduzir o peso dos gastos obrigatórios no Orçamento -- 55% deles referentes a aposentadorias.
Embora não tenha ido ao detalhe, presume-se que se trata de aval à proposta de estabelecer uma idade mínima para a aposentadoria que consta da Agenda Brasil, elaborada sob liderança política do Senado para preencher o vazio da pauta presidencial.
Dilma também endossou a promessa de cortar dez ministérios e mil cargos comissionados (5% do total).
Anunciada pelo ministro do Planejamento, Nelson Barbosa, a medida, passe o trocadilho, foi mal planejada: não se sabe sequer quais pastas serão eliminadas, muito menos que economia a iniciativa poderá promover.
Ainda assim, há algo de simbólico nesse possível corte -- e a presidente mais impopular da história pode tentar recuperar, com esse gesto, alguma conexão com as ruas.
Será difícil, para não dizer impossível.
Escamotear a verdade ou descumprir recentes promessas, contudo, de nada ajudarão Dilma Rousseff a retomar prestígio e credibilidade em níveis mínimos para fazer avançar uma agenda de reformas imprescindíveis ao país.