O dia em que Dilma piscou 06/09/2015
- Carlos Brickmann - Observatório da Imprensa
Uma língua curiosa, a nossa: pode-se dizer, tanto faz, que a presidente Dilma não é capaz de nada, ou que a presidente Dilma é capaz de tudo.
Dizem que é brava, mandona, prepotenta, exigenta, ciosa da autoridade.
Mas aceitou que o presidente do segundo banco do país, o Bradesco, lhe transmitisse as exigências de grandes empresários para que dessem apoio ao governo.
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Se ela não aceitasse, Joaquim Levy, indicado pelo Bradesco, pediria demissão.
Era pegar ou largar.
Os empresários, entre os maiores do país, se reuniram com Joaquim Levy na noite do dia 2 e na madrugada do dia 3, em São Paulo.
Logo depois da reunião, Dilma aceitou voltar aos números que tinha abandonado, como o superávit primário de 0,7% (que tinha virado um déficit de 0,34%).
Para isso concordou em cortar despesas até mesmo nos seus programas sociais favoritos e adiar programas de governo que considerava intocáveis.
Objetivo dos empresários: manter o Brasil como merecedor do grau de investimento das agências de classificação de risco.
Sem esse grau, os empréstimos externos ficariam bem mais caros (esqueça o discurso eleitoral de que o Brasil não deve nada ao exterior. Deve, sim).
É difícil cortar despesas num governo que, numa viagem aos Estados Unidos, aluga 22 limusines para a comitiva; que abriga mais de cem mil funcionários comissionados, sem concurso; que não tem como, por exemplo, retirar os milhares de carros que parlamentares e magistrados têm à disposição.
Os empresários se dispõem a ajudar, indicando cortes possíveis.
Possíveis, talvez; mas doloridos.
Miragem e fato
Empresários com acesso à presidente garantem sustentação a Levy.
E daí?
Daí, por enquanto, nada: Aloizio Mercadante, espírito-santo-de-orelha de Dilma, sempre prometeu dar apoio a Levy e sempre o sabotou.
Fortes grupos petistas se opõem a Levy.
Lula, inventor de Dilma, sugere que a política fiscal seja afrouxada.
Dilma, por ela, gostaria é de mandar nos empresários.
E há o Petrolão.
Economia bamba e governo fraco não resistem a uma delação premiada.
Lembrando o futebol
Mercadante deu entrevista dizendo que Levy está firme, o ministro Edinho Silva garantiu a permanência de Levy, Dilma disse que Levy fica.
Em futebol, quando dizem que o técnico está prestigiado, só falta marcar a data da saída.
Treme-treme 1
A intervenção dos empresários, por mais que Dilma se ressinta da intrusão, é uma boa notícia para o governo.
Mas as notícias ruins continuam fluindo.
A delação premiada de Ricardo Pessoa, o chefão da empreiteira UTC, disse ao juiz Sérgio Moro que parte das propinas que pagou para ganhar contratos na Petrobras foi depositada diretamente na conta do PT.
Há ainda trechos secretos da delação premiada -- secretos porque, como envolvem pessoas com mandato federal, só podem ser liberados pelo Supremo.
Mas o que já foi divulgado é explosivo.
Treme-treme 2
Um cavalheiro bem menos conhecido do que Pessoa, mas que também sabe onde está a dinamite, negocia sua delação premiada.
É Leonardo Meirelles, do Laboratório Labogen (e sócio do doleiro Alberto Youssef, aquele).
O Labogen chegou a assinar contrato com o Ministério da Saúde, na época do ministro Alexandre Padilha (hoje secretário da Saúde de Haddad, em São Paulo).
Sua especialidade, segundo as acusações (o que explica a proximidade com Youssef): contratos de câmbio para entrada e saída de moeda com cinco firmas estrangeiras, tudo indicando fortes possibilidades de lavagem de dinheiro.
Meirelles já abriu fogo, antes mesmo do acordo: acusou a Odebrecht de usar o Labogen para repassar R$ 7 milhões em propinas fora do país.
E seu advogado afirma que o Labogen fez mais de quatro mil operações irregulares no Exterior, “envolvendo mais de um político”.
Segundo se diz, ele atinge políticos do governo e da oposição.
Tecendo a teia
Michel Temer disse que não vai mexer uma palha contra Dilma ou em favor do impeachment (nem precisa: ela e seus assessores cuidam disso sozinhos).
1 - Mas num debate em São Paulo disse uma frase mortal, comentando os raquíticos índices de aprovação da presidente: “Ninguém vai resistir três anos e meio com esse índice baixo”.
É verdade; Temer não disse nenhuma novidade. Mas ao pronunciar essa frase ele rompeu a barreira do silêncio, daquilo que todos sabem mas ninguém comenta.
Não se imagine que o vice-presidente, um homem cauteloso, que pesa cuidadosamente suas palavras, tenha “deixado escapar” essa frase.
Temer jamais deixou escapar frase alguma, jamais disse algo que não quisesse dizer.
O que disse, em outras palavras, é que Dilma caiu.
Só falta avisá-la.
2 - O PMDB trabalha em silêncio na busca de votos suficientes para aprovar o impeachment.
Não tem, no momento, a maioria necessária para afastar a presidente.
Mas já há votos para acolher o pedido de impeachment, discuti-lo e votá-lo.
No cálculo do PMDB, o tempo joga contra Dilma: à medida que o governo se enfraquece, mais gente troca de lado.
Isso já aconteceu com o presidente Collor.
Faz parte do instinto de sobrevivência dos políticos.
O conciliador Temer é, para eles, muito melhor que a intratável Dilma e seu PT dono da verdade.