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CURTO & GROSSO
Edição de 10/12/2003
Marcos Antonio Moreira -- fazperereca@yahoo.com.br
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Não deu outra:
Por excesso de “caciques” e falta de índios legalmente habilitados, melou a pajelança desta terça-feira, realizada no Palácio Paiaguás, na tentativa de pacificar os ânimos entre xavantes -– os donos da terra -- e invasores da fazenda Suiá-Missu, localizada no município de Alto de Boa Vista, Vale do Araguaia.
Para não dizer que não serviu para nada, a reunião serviu para o vice José Alencar descobrir que presidente em exercício manda menos que presidente efetivo da Funai e -– espera-se -– para que o governador Blairo Maggi finalmente perceba que nem tudo comporta soluções mágicas, simplistas, mercadológicas e que existem certos valores que não são e jamais podem ser objeto de negociação do tipo toma-lá-dá-cá.
Entenda o caso:
A área de quase 180 mil hectares em que o grupo Agip-Liquigás – controlado pelo Estado do Vaticano -- instalou a fazenda Suiá-Missu, sempre foi considerada patrimônio imemorial dos índios xavantes.
E passou a ser patrimônio de fato e de direito, depois que o papa João Paulo II decidiu devolver a fazenda, durante visita que fez à Capital de Mato Grosso, há 15 anos, resultado de uma luta insistente e persistente de Dom Pedro Casaldáliga, bispo da prelazia de São Félix do Araguaia.
Foi o que bastou para a área ser invadida, prosperasse até uma animada currutela no lugar, tudo com o aval de Cartório de Registro de Imóveis e graças à omissão da Funai e às vistas grossas das autoridades locais.
Agora os posseiros, com boa dose de razão, reivindicam no mínimo um ressarcimento, já que têm em mãos documentos de fé pública ou que deveriam ser.
O caso foi parar -– literalmente -- na Justiça, onde vem se arrastando a passo de cágado estressado há oito ano; morosidade que acabou contribuindo para agudizar a animosidade entre os índios e os invasores, atualmente em pé-de-guerra e a um passo de uma carnificina.
A delicadeza da situação levou à frustrada reunião de ontem no Paiaguás, entre o governador do Estado e o presidente da República em exercício, à qual compareceram representantes dos posseiros; os caciques Raoni e Aritana, das nações Caiapó e Yawalapiti, respectivamente e -– conforme era de se esperar -- nenhuma liderança xavante.
A ausência dos principais interessados na questão foi “justificada” pelo fato de o presidente da Funai ter desacatado ordens expressas do presidente em exercício, no sentido de que um avião fosse buscar as lideranças xavantes para o encontro de conciliação.
O espetaculoso presidente da Funai se autoproclamou "representante xavante", mas não passa do que realmente é: presidente da Funai. Ainda.
Mas o fato é que os xavantes não viriam nem peados, pois além do componente cultural, sentimental, Suiá-Missu tem agora para aquela nação indígena um valor ainda mais profundo -– o fato de a fazenda ter sido devolvida a eles pelo próprio papa, convencido do direito que têm sobre aquela área.
Foram esses valores -– que não têm preço e não admitem troca -– que foram afrontados pelo governador de Mato Grosso, quando, bem a seu estilo, veio com a “solução” mágica para a questão: a permuta de Suiá-Missu por uma outra área de valor equivalente...
Tem gente que vende a mãe a prestação e entrega, claro. Mas nem todo mundo é assim.
Aliás, a grande maioria não é assim. E o governador não precisaria andar muito longe para descobrir isto: basta atravessar a avenida Rubens de Mendonça para, do outro lado, no bairro Morada do Ouro, ver lá o Memorial João Paulo II, construído no exato local onde o papa rezou a missa em Cuiabá.
Ora, se o local onde o papa rezou a missa ganhou uma significação especial, quase um objeto de culto para a população católica, uma espécie de “Terra Santa”, por que Suiá-Missu -- que foi doada e não apenas visitada pelo papa --, para o xavante, teria uma significação diferente?
Se o senhor Blairo Maggi, para atender posseiros, oferecesse uma área maior para a construção do Memorial João Paulo II, a população católica aceitaria?
Por que, então, o xavante deveria aceitar trocar Suiá-Missu para vê-la transformada em mais uma imensa plantação de soja?
Santa ingenuidade!
Foi exatamente para não ouvir este tipo de proposta indecente que nenhuma liderança compareceu ontem ao Paiaguás.
Com ou sem avião da Funai.
Conforme dissemos aqui ontem nestes tristes tópicos, o xavante é um povo diferenciado...
...Mas, nos valores fundamentais, é igual a todo mundo.
E o "deus" Mercado que se foda!
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Falar em mercado...
"Nunca foi tão urgente a literatura anti-mercado diante de um governo que, apesar dos desígnios ideológicos e doutrinários em contrário, vai se rendendo mais uma vez ao medíocre receituário liberal dos economistas que reduzem o caráter pletórico do Estado ao mero exercício atuarial das contas-dobradas (receita e despesa)!
"Pensar que a civilização possa ter regredido ao ponto de reduzir a Política à administração de Orçamento!"
O desabafo é do professor Arnaldo Fortes Drummond, da Universidade Federal de Uberlândia/MG, cuja tese está sintetizada no artigo "O agir econômico e a morte do mercado", que reproduzimos na seção "Releitura" desta quarta.
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Ainda o rescaldo da pajelança no Paiaguás:
Além de descobrir que presidente em exercício manda menos que aspone da Funai, o vice José Alencar teve o dissabor de ser "cocarado" pelo cacique Raoni.
Tentou refugar o brete e tal, mas -- embora com cara de poucos amigos -- acabou com o cocar na cabeça.
Entenda o caso:
Cocar na cabeça de não índio é 100% fatal. Fim de carreira na certa -- caso do presidenciável que virou motorista de madame...
...Caso, também, do cantor Sting -- também "cocarado" por Raoni --, que sumiu das paradas...
...Isto quando não acontece coisa pior -- caso de Ulisses Guimarães, vítima de acidente aéreo.
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